Lanchas Carbrasmar – Um pouco de história
Era o início dos anos 60: Num apartamento da Rua Nascimento e Silva, um grupo de rapazes e moças cariocas criavam a Bossa Nova. Nas ruas, Camaros, Cadillacs e Buicks, com seus rabos de peixe e buzinas de vários tons, começavam a sofrer a concorrência de um tosco carrinho de duas cores, feito no Brasil e chamado Simca Chambord. O Botafogo tinha um timaço e a seleção brasileira começava sua jornada rumo ao bi-campeonato. Nas TVs à válvula e em preto-e-branco, o Vigilante Rodoviário era o ídolo da garotada e Mike Nelson tornava-se sinônimo de mergulhador. Na Tv Tupi, os cariocas assistiam aos desfiles de Miss Brasil torcendo para sua candidata, enquanto os bikinis surgiam timidamente nas praias de Ipanema, tirando o sono dos papais e das mamães das mocinhas. Nos ringues, Eder Jofre sagrava-se campeão mundial de boxe Peso Galo.
E no mar, as lanchas Crabrasmar navegavam…
A Carbrasmar foi fundada em 1956. Da prancheta de seu principal engenheiro, um alemão de nome Joachim Kürsters, magníficas lanchas tomavam corpo, tendo como principais características a beleza, a ergonometria e a navegabilidade. Ainda hoje lendário, diz-se que utilizava apenas três tipos de curvas para realizar seus desenhos.
Mas foram nos anos 60 que elas tiveram seu apogeu.
Eram estrelas nas competições de peixes de bico. Nas páginas de “O Cruzeiro” e “Manchete” eram figurinhas fáceis, com vários artistas e famosos sendo fotografados a bordo de várias. Eram objetos de desejo e figuraram em vários filmes brasileiros da época, sempre sinônimos de glamour e elegância
O estaleiro produzia suas embarcações em seu galpão junto ao Mercado São Sebastião, na Av. Brasil. Lá, eram fabricadas de maneira quase artesanal, com profissionais treinados no próprio estaleiro e que mais tarde tornaram-se referência em seu ramo de trabalho. Além de produzir barcos históricos, A Carbrasmar produziu também uma rara mão de obra de altíssima qualidade.
Os cascos lá produzidos eram, em sua maioria, de dois tipos: Laminado ou Trincado. O último é o mais famoso deles, e o que em maior quantidade chegou até nós. Eram feitos com um esmero que hoje não existe mais e quando uma lancha saía do estaleiro, era quase uma peça única.
Apenas madeiras nobres e bem secas eram utilizadas: Vinhático (importado da Ilha da Madeira) para a estrutura, cabine e tabuado acima da linha dágua, e peroba do campo para quilha e tabuado abaixo da linha dágua. Eram utilizados parafusos de latão e rebites de cobre, pois o inox era raro e caríssimo. Nas laminadas, mogno e cedro eram as escolhidas.
Foram fabricadas em diversos tipos e tamanhos. As mais famosas eram as Xareu, até 22 pés e sem cabine, uma lancha feita para passeios e esportes náuticos e que serviram ao Corpo Marítimo de Salvamento, tornando-se, juntamente com os postos de salva- vidas que até hoje dão nome a regiões de Copacabana, um símbolo das praias cariocas.
Outras eram as Dourado, uma lancha cabinada de até 26 pés e que foram fabricadas com ou sem Fly-bridge. Mais tarde vieram as Barracuda, de até 28 pés, que foram fabricadas até 1973.
Existiram outros modelos, de até 47 pés, mas cujos nomes se perderam.
A motorização era basicamente a gasolina, com motores Volvo de 4 a 6 cilindros. Os diesel utilizados eram igualmente Volvo, os AQD32 até 28 pés e os TMD nos modelos maiores e mais modernos. A impulsão era feita com pés de galinha ou rabetas.
Porém, os anos 70 marcaram o fim do uso da madeira. O engenheiro argentino Lopes Setti passou a supervisionar a construção em fibra de vidro e o estaleiro começou a produção de lanchas com esse material e com o mesmo plano de linhas das anteriores. É por isso que temos Xaréus e Dourados também em fibra de vidro. O desenho da Barracuda deu origem às famosas Carbrasmar 32, objetos de desejo e valorizadas até hoje.
Então, na medida em que eram substituídas pelos barcos de fibra, foram sendo lentamente abandonadas nos pátios dos clubes, com seus restos sendo vendidos para padarias ou simplesmente levados para os aterros sanitários. Algumas foram abandonadas para morrer em praias da Baia da Guanabara, outras simplesmente queimadas. Desprezadas em nome da modernidade e da praticidade dos novos brinquedos.
E a época das lanchas de madeira chegou ao fim.
Texto extraído do site: http://www.woodenboatlovers.com.br/